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PRESSA DE VIDA ABUNDANTE

Venha a JMJ. Estamos prontos para partir.
Apressadamente, porque movidos pelo entusiasmo e alegria, mas na busca plena do sentido da Vida com e para todos, porque todos somos Gailhac!

“Maria levantou-se e partiu apressadamente” é a citação bíblica, do Evangelho de Lucas, que o Papa Francisco escolheu para o lema da JMJ, cuja realização se aproxima com igual pressa. Dificilmente uma citação poderia estar tão ligada aos tempos que vivemos como esta: na verdade, nós passamos a vida a correr... como desalmados.

Acordamos apressados, tomamos o pequeno-almoço com um olho nas primeiras notícias da televisão e outro no telemóvel, enfiamo-nos no trânsito enquanto consultamos a agenda, chegamos em cima da hora, cumprimos rigorosa e atempadamente a programação da nossa disciplina, engolimos as garfadas do almoço enquanto mastigamos trabalho, participamos na reunião ansiosos que o dia termine e num ápice estamos de volta ao carro e ao barulho do trânsito e finalmente, chegados a casa, estatelamo-nos no sofá percebendo que a coisa assim fica difícil, que já não podemos mais a não ser que sonhamos de olhos abertos e, exaustos, enquanto jantamos qualquer coisa ao som de um qualquer debate da televisão, deitamos o olho à net e aproveitamos rapidamente, antes que esgote, uma estadia num qualquer lugar aparentemente paradisíaco para que, chegado o tão ansiado dia, nos levantemos às quinhentas – que os voos estão caros e as cinco da manhã em tempo de férias equivalem às dez em trabalho – para chegarmos ao destino e andarmos como ratos às voltinhas para não perdermos pitada – que as viagens estão caras e se eu paguei tenho que aproveitar ao máximo – e regressarmos às quinhentas – já disse que as viagens estão caras? – e tentarmos dormir no avião para podermos, finalmente! descansar, no trabalho.
Ufa! Soa familiar? Na verdade, bem vistas as coisas, não é na pressa que vivemos, mas em permanente sobressalto.

A pressa de Maria nada tem a ver com esta nossa inebriada sofreguidão.

A pressa de Maria era motivada por uma dupla necessidade: uma, sua, a de partilhar tão grande alegria que não cabia apenas o seu peito: ia ser Mãe do Salvador; outra, a da sua prima Isabel, que à sua esperançada maternidade, juntava uma idade que requeria cuidados especiais. Era, portanto, uma pressa que tinha nascido inteiramente da dupla disponibilidade de Maria: a de lançar um olhar sobre si mesma à luz do seu encontro com o Senhor; e a de partir, com Deus dentro, com um destino bem definido, com um propósito, com a urgência a revestir-se de sentido de vida.

E como o sentido muda tudo!

Os nossos encontros de preparação da JMJ no Porto foram sempre à sexta-feira. Ao final da tarde. O esquema base não inventava nada e variava pouco: acolhimento, jantar partilhado, reflexão bíblica, debate partilhado em pequenos grupos, oração. À sexta-feira! Ao final da tarde! Espantava-me sempre a alegria contagiante daquela malta nova que, de entre todas as possibilidades que a belíssima cidade do Porto oferece, escolhia encontrar-se para refletir e rezar numa sexta-feira. Ao final da tarde! E recordo invariavelmente a quantidade de opiniões e de teses e textos e dissertações que delineiam uma infinidade de estratégias para que os jovens não abandonem a Igreja. E recordo ainda os convites a pedagogos e psicólogos e sociólogos e tudólogos que, com todo o seu imbatível conhecimento e indefetível boa vontade, por vezes nos deixam mais confusos e perdidos e prontos para recomeçar tudo a partir do zero, porque tudo o que aprendemos até hoje não deu resultado. E recordo também – não sem algum acicatante questionamento - que o CoMTigo (Movimento Juvenil do Coração de Maria), já existe há alguns anos e como, apesar de vivaço e até pujante em tantos momentos, nunca teve este nível de adesão e, sobretudo, de compromisso.
O que mudou? O que motivou este alegre comprometimento de tanta malta nova? O que fez com que perguntem, insistentemente, quando irá ser o próximo encontro? A resposta é-nos dada, como tantas vezes acontece, por Maria: a descoberta de um novo sentido, de um novo olhar, profundo, de si mesmo, à luz do encontro íntimo, pessoal, com o Pai; e o desejo – a inevitabilidade? - de partir com Deus dentro, com um propósito, rumo a um destino bem definido, agora revigoradamente urgente porque pleno de sentido.

Temos tanto a aprender! Temos, todos, ainda tanto a aprender!

Por mais que enchamos a boca com as recomendações do Papa Francisco para regressarmos à simplicidade do Evangelho, quando toca a escolher a forma como vivemos a vida vivida são quase sempre outros os paradigmas que preferimos.

Pior: quando somos chamados a viver, na partilha, uma fé que contagie os que dela estão ávidos – muitas vezes sem o saberem, outras negando provocatoriamente essa fome e sede de infinito – confiamos pouco na Palavra de Deus, desconfiamos da oração, tememos a profundidade de Jesus e coartamos o Espírito, persistindo em enclausurar um Deus que se quer e nos quer profundamente livres. E teimamos, uma e outra vez, em viver em círculos, apressados, enclausurados ao ar livre, a correr para lugar nenhum, feitos baratas tontas, às voltas e voltinhas, entretidos numa vida apenas aparentemente grande, mas vazia, porque assenta num fugazmente ilusório sentido que se esgota logo que termina a viagem. E transmitimos essa sofreguidão à nossa malta nova, ainda por cima sendo sempre ligeiros na forma como criticamos o seu desassossego.

O Padre Gailhac, na sua profunda sabedoria, escrevia: “Façamos tudo o que pudermos, mas permaneçamos serenos.” É nosso desejo profundo, sempre, seguirmos os ensinamentos do Padre Gailhac e aproveitarmos esta oportunidade para regressarmos, todos, jovens e graúdos, à serenidade simples do Evangelho. Será, sem dúvida, uma tarefa hercúlea, no meio de tanta festa e festança e grandiosidade e fogo de artifício. Mas tentaremos, mais uma vez, imitar Maria: guardar todas as coisas no coração para que as possamos viver e ajudar a viver na intensidade do encontro profundo com Deus, connosco próprios e com todos aqueles que caminham connosco.

Venha a JMJ. Estamos prontos para partir. Apressadamente, porque movidos pelo entusiasmo e alegria, mas na busca plena do sentido da Vida com e para todos, porque todos somos Gailhac!

José Pinho
Educador