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CONTRA A POBREZA E CONTRA A RIQUEZA

Hoje é Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza.

Este dia devia funcionar como símbolo, como sinal, a lembrar que a situação da multidão de pessoas pobres é um problema nosso, é um problema do nosso agir individual e dos governantes que deviam ouvir o clamor dos pobres e parece que só ouvem os interesses dos ricos. Por isso, podemos dizer que é preciso lutar, com todas as forças, contra a pobreza e contra a riqueza. Há cada vez mais pobres porque há cada vez mais quem – poucos – acumula riqueza. E só se combate a pobreza, combatendo a riqueza, porque há recursos suficientes para a digna subsistência de todos.

São João Crisóstomo (347-407), arcebispo de Constantinopla, dizia aos cristãos: «Não podeis esquecer nunca que, não partilhar riquezas com os pobres, é roubar os pobres e privá-los dos seus meios de subsistência. Os bens que detemos não são apenas nossos, mas também deles». Santo Agostinho (354-430), bispo de Hipona, denúncia o mesmo: «O supérfluo dos ricos é propriedade dos pobres».

Grito multifacetado

Nos nossos dias, o Papa Leão XIV, retomando o pensamento e as preocupações do Papa Francisco, exorta-nos, dizendo: «A condição dos pobres representa um grito que, na história da humanidade, interpela constantemente a nossa vida, as nossas sociedades, os sistemas políticos e económicos e, sobretudo, a Igreja. No rosto ferido dos pobres encontramos impresso o sofrimento dos inocentes e, portanto, o próprio sofrimento de Cristo.
Ao mesmo tempo, deveríamos falar, e talvez de modo mais acertado, dos inúmeros rostos dos pobres e da pobreza, uma vez que se trata de um fenómeno multifacetado; na verdade, existem muitas formas de pobreza: a daqueles que não têm meios de subsistência material, a pobreza de quem é marginalizado socialmente e não possui instrumentos para dar voz à sua dignidade e capacidades, a pobreza moral e espiritual, a pobreza cultural, aquela de quem se encontra em condições de fraqueza ou fragilidade seja pessoal seja social, a pobreza de quem não tem direitos, nem lugar, nem liberdade». (Dilexi Te, nº 9).

O Evangelho que interpela

Há sobretudo três textos dos Evangelhos que me interpelam fortemente, na questão da pobreza. O primeiro é o do rico e do pobre Lázaro (Lc 16, 19-31). Muitas vezes não vemos os pobres, só temos olhos para os que têm sucesso. O rico, que se banqueteava e se vestia de púrpura e linho fino, não via o pobre e, quando passou para o outro lado da vida, continuou a ter olhos para os bem-sucedidos. Não reconhecia Lázaro que definhava à sua porta com fome, doente e com roupa esfarrapada, mas quando o viu no seio de Abraão, até sabia como se chamava. Claro, estava entre os afortunados… Os meus olhos e o meu coração viram-se para quem?

O segundo (Mt 25, 31ss) apresenta pessoas que não suportavam ver outras a sofrer e, por isso, socorreram-nas e outras que passavam indiferentes aos seus sofrimentos. Umas e outras ficaram admiradas porque o Senhor se identificou com os pobres de pão, de roupa, de afectos, com os descartados, como dizia o Papa Francisco. Onde poderei encontrar-me com Deus invisível, de forma concreta, mesmo física?

O terceiro (Lc 4, 16-30) diz-me que a minha vida só tem sentido se me abrir ao Espírito que me envia a anunciar a Boa-Nova aos pobres, a proclamar a libertação aos que estão presos pelos medos, pelos preconceitos, pela ilusão da sua própria importância, e a proclamar que o nosso Deus só sabe amar, só sabe ser misericordioso e que enviou o seu próprio Filho à Terra para que todos tivéssemos vida e vida em abundância. No entanto, não chega anunciar e proclamar, tenho de promover a vida e dignidade de todos os nossos irmãos e irmãs, aqui e agora, colocando-me ao serviço daqueles que têm mais necessidade de justiça tornando os fracos, os mais necessitados, os marginalizados, os sem voz, capazes de trabalharem efectivamente pelo seu próprio desenvolvimento e libertação, segundo a Declaração da Missão das RSCM.

Raiz dos males sociais

Termino com o Papa Francisco que aponta a desigualdade como a raiz dos males sociais: «enquanto não forem radicalmente solucionados os problemas dos pobres, renunciando à autonomia absoluta dos mercados e da especulação financeira e atacando as causas estruturais da desigualdade social, não se resolverão os problemas do mundo e, em definitivo, problema algum». (A alegria do Evangelho, nº 202).

Cada um de nós tem a responsabilidade de contribuir, concretamente, para a erradicação da pobreza, denunciando a acumulação da riqueza e a indústria de armas que mantem e fomenta a guerra que geram pobrezas de toda a ordem.

Ir. Maria Julieta Dias, rscm