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VALORIZAR O INTANGÍVEL

Inteligência Artificial e Inteligência humana.

“A Inteligência Artificial (IA) é um ramo da ciência da computação que se concentra no desenvolvimento de máquinas e software com capacidade de inteligência. Isso significa que eles podem aprender, raciocinar, perceber, compreender a linguagem, e resolver problemas de maneira semelhante aos humanos”.
É assim que se define, pelas suas próprias palavras, esta realidade que promove uma transformação sem precedentes em várias áreas da nossa existência. Para manter-se humano, vale apostar na capacidade única de “captar o intangível”. O que nos distingue como humanos passa pelo que não se vê e o que não se mede.

A IA responde às expectativas da maioria e ao conhecimento existente

Quais as limitações dessa abordagem? Onde fica a possibilidade de gerar novo conhecimento? São questões prementes, que se intensificam quando o tema é a educação. A lógica do algoritmo é apresentar o que é confortável para maioria das pessoas, para a bolha a quem se destina. Neste contexto, é fundamental a criação de relações de confiança, não pixelizadas, como base para uma educação que realmente impacta e transforma.

As máquinas têm uma capacidade “imensamente maior” que os seres humanos de memorizar os dados e relacioná-los entre si. O problema de fundo é outro: “compete ao homem, e só a ele, descodificar o seu sentido”, como escrevia o Papa Francisco.

Discutir cenários hipotéticos parece uma perda de tempo e uma distração das questões que realmente importam no presente. Entendo, porém, que existe uma obrigação moral da nossa parte, com as gerações futuras, de antecipar questões e cenários, para iniciar reflexões que permitam a construção de um quadro ético onde o desenvolvimento de tecnologia aconteça num horizonte de respeito pela dignidade humana.

A questão de fundo

Falei, numa conferência a este respeito, numa espécie de “IKEA-Logia”, a respeito da IA. A democratização do conhecimento, da criatividade – e eu que desenho tão mal, de repente, com novas possibilidades para me exprimir – fascinam, mas abrem questões. Quem vai questionar esse desenvolvimento se ele for entregue meramente à inteligência artificial, que se baseia no conhecimento adquirido e não nas possibilidades inauditas do futuro? Com ou sem tecnologias revolucionárias, a questão de fundo é sempre antropológica e não técnica. A comunicação é humana, acima de tudo.

Perguntei a um chatbot como vê a possibilidade de persistir num universo sem palavra. Vale a pena reparar na resposta:

“Num universo sem palavras, a arte e a poesia seriam ainda mais importantes, como pontes de conexão entre as pessoas e como forma de expressar a beleza, a emoção e a complexidade da experiência humana. E eu, como um amante da arte e da poesia, me dedicaria a explorar e promover essas formas de expressão, ajudando a construir um mundo onde a comunicação e a conexão humana continuassem a florescer, mesmo na ausência de palavras.”

Há uma nova consciência – tecnológica, antropológica, económica, social, política, ambiental… Sempre foi claro e agora parece ser mais evidente do que nunca: é preciso mudança para que exista futuro.

O futuro que já chegou

Aqui, o ponto de partida é fundamental: o futuro já chegou e é habitado por uma inteligência artificial, mas não quero ser excessivamente pessimista: a IA pode abrir caminhos para um mundo que se reencontra mais humano na tecnologia que aparentemente o desumanizava. Um mundo que acolhe todos aqueles que, criativamente, estão a reler este momento em que o futuro chega às nossas vidas, que ainda são também presente, passado e tudo o que podem ser, mesmo que nunca o tenhamos imaginado.

O amor, o coração, o que nos faz iguais nas dores de cada dia é um desafio que não pode ser artificializado e convoca a comunicação desde o mais íntimo de cada um. A esse respeito, entendo que a perda do sentido de comunidade, alimentada pela IA, é efetivamente um dos maiores perigos que é possível identificar.

A hipervelocidade mediática, em tempos de exposição constante, arrasou um fundamento central da existência: a incompletude. Comunicamos não só por querer partilhar, mas também para encontrar algo do que nos falta, para nos completarmos.

Octávio Carmo
Jornalista