São estas palavras do falecido Papa que se interiorizaram em mim e me recordam aquela que considero a minha parte favorita da fé: a capacidade que ela tem de levar quem acredita a refletir sobre as suas atitudes e a corrigir os seus comportamentos.
Acredito que a preguiça seja um dos sentimentos mais universais e partilhados da humanidade. Somos seres racionais e, como tal, temos consciência não só do que devemos fazer, mas também da tão pequena vontade que, por vezes, vive em nós de o realizar.
Vivemos vidas ocupadas, sempre com a percepção de que temos menos tempo do que precisamos, pelo me parece natural surgir uma despriorização, de entre todas as nossas obrigações, daquilo que menos nos apraz fazer, pelo simples motivo do facilitismo.
No entanto, na minha experiência enquanto jovem católica, aprendi muitas vezes que o caminho mais fácil raramente é o mais correto. Talvez seja por isso que as palavras do Papa Francisco me tocam tão profundamente: ser verdadeiramente católico não me parece ser apenas desejar um mundo melhor, mas agir de forma concreta para o transformar, o que, muitas vezes, implica superar a preguiça e vencer a indiferença.
Esta tentação de adiar o bem, de esperar que outros façam o que também a nós nos cabe fazer, impede-nos de transformar em ações concretas os ensinamentos de Cristo. Creio que a fé que não se traduz em gestos, que não ultrapassa a intenção, não se torna vida, e o que é a fé senão a forma como a nossa presença se reflete nas nossas ações?
Questiono-me se a preguiça não é também uma das formas mais silenciosas de autossabotagem.
Impedimos o nosso próprio progresso não por falta de capacidades, mas por comodismo, prejudicando o nosso meio envolvente mas também nós próprios. Vivemos uma sensação enganosa de repouso, enquanto nos retiramos oportunidades e potencial. Parece-me triste que tantas vezes nos contentemos com tão menos do que podíamos alcançar.
Muitas vezes, confundimos os conceitos descanso e preguiça, afirmando que o segundo na verdade se trata do primeiro. O descanso legítimo é necessário, por nos permitir recuperar energias, refletir, organizar pensamentos e preparar-nos para agir com mais clareza e eficácia. É uma pausa consciente, que nos fortalece e nos torna capazes de enfrentar os desafios da vida. Mas a preguiça, por outro lado, faz-nos permanecer inertes não para recuperar, mas para evitar esforço, para adiar responsabilidades e para nos conformarmos com o mínimo. A preguiça impede-nos de crescer e de cumprir objetivos e enganarmo-nos a nós próprios só nos prejudica.
Existe também uma certa predisposição para associar a preguiça à juventude, uma fase da vida em que apesar de se estar no auge da energia, os jovens se confinam e escondem, desistem das suas obrigações e objetivos e se rendem ao conformismo.
Parece-me, porém, que quem defende esta perspetiva cai, por vezes, numa falácia. Os jovens parecem, por vezes, pouco entusiasmados com o mundo, mas suspeito que seja porque o herdaram tão quebrado.
A verdade é que a apatia dos jovens talvez não seja sinal de preguiça, mas de desalento.
É difícil entusiasmar-se com um mundo que lhes oferece cada vez menos certezas, menos oportunidades e menos sentido.
Não quero, com isto, afirmar que esse distanciamento seja justificável. Pelo contrário, aos jovens que se sentem desmotivados, lanço um apelo: confrontem os problemas que o mundo vos apresenta com determinação, transformando-os em razões de entusiasmo e de transformação.
Porque com tanto mundo fraturado, seria indigno não contribuir para concertar ao menos a nossa pequena parte. E quando assim o fazem, quão admiráveis são os jovens! Determinados no associativismo, dados ao voluntariado, devotos à fé, exigentes na proteção dos direitos humanos, na casa e na causa comum.
Talvez, em outros casos, a preguiça que se observa nos jovens não seja mais do que o medo disfarçado de fracassar, de enfrentar responsabilidades que parecem demasiado grandes para corações inexperientes. Crescemos num mundo em que o erro é por vezes desmerecido como parte do caminho, mas como sinal de fraqueza, em que vivemos numa preocupação constante pela forma como os outros nos percecionam. Parece natural que muitos prefiram a certeza de que não se irão dececionar, se não tentarem. Mas talvez seja esse o maior ato de coragem da juventude: escolher agir, quando seria tão mais fácil ficar-se parado.
Neste dia 7 de novembro, em que celebramos o Dia Internacional da Preguiça, relembremo-nos que, por mais que custe, a preguiça não é invencível nem nos torna reféns. Cabe-nos a nós encontrar a força de vontade para agir, mesmo quando tudo parece pesar, e transformar a intenção em ação. Porque a verdade é que a preguiça só tem poder sobre nós quando deixamos.
Marta Gonçalves





















